No ruído é que há vida
Andrea May se apresenta essa semana em São Paulo
Andrea May ou May HD é uma artista que acompanho de perto há mais de uma década, mesmo estando longe. Agora, no entanto, nossos caminhos parecem finalmente se cruzar com a semana intensa de apresentações que a artista fará de hoje a quinta em São Paulo.
Formada em artes plásticas pela UFBA, toda a obra desenvolvida por May tem como centro de desenvolvimento o ruído, ora pendendo para questões visuais, ora focando-se na exploração e produção sonora. Desde os livros de artista que desenvolveu e expôs, sua inserção na arte urbana, até suas performances e instalações, todas suas obras trabalham o som, esteja esse som sendo emitido ou transmitido visualmente.
Conversei brevemente com a artista sobre seus projetos, sua trajetória e um pouco sobre sua visão do lugar que a arte sonora vem ocupando.
Foto: Junix
PoroAberto: Quais são seus principais projetos relacionados à música hoje?
May HD: Atualmente venho me dedicando a dois projetos que se cruzam em segmento e forma de expressão: o projeto solo ‘noisy turntablism’ ou discotecagem ruidosa, registrado e disponibilizado em dois disquinhos digitais nesse primeiro semestre de 2019 e o duo com Junix 11, multi instrumentista e produtor (parceiro na arte e na vida) cujo trampo lançaremos em julho pelo Sê-lo e Proposito Rec. Em ambos, busco traçar caminhos paralelos à minha pesquisa de pós-graduação, cujo título resume um pouco destes trabalhos: RUÍDO-MOTRIZ.
PA: Fala um pouco da sua expectativa com essa semana intensa de apresentações em São Paulo e da relação estabelecida com as mulheres, Nahnati e Bella.
May HD: Estou muito ansiosa por estes encontros sonoros! A conexão com Nahnati e Bella se deu de forma muito espontânea e no tempo certo das minhas construções de pensamento e experimentações artísticas, o que me faz acreditar nas conjunturas astrais principalmente entre mulheres. Sempre fui das redes de arte, agregando, somando esforços coletivamente e sigo nessa vibe. Feliz que encontrei essas duas que foram meu imã para essa vinda a SP.
PA: Como foi o InstruMentes com a Bella em Salvador? Qual a importância desse projeto pra você?
May HD: Pelo que entendi do Instrumentes trata-se de um projeto completo no sentido da pesquisa e realização, perfeito estar acontecendo em Salvador neste momento onde visões e escutas se ampliam para a Arte Sonora ainda tão recente para a maioria. E o fato da Bella ter participado foi especial pois seu trabalho desperta muita curiosidade além ter proporcionado ações complementares como a sua participação no Ciclo Aberto de Palestras do IHACLabi da UFBA e o também na live performance ‘epifanias & improvisos’ que fizemos juntas com participação do Edbrass no Mercadão.CC . Creio que este período foi uma grande experiência para ela também.
PA: Como você vê a possibilidade de criação de Arte Sonora em Salvador hoje e a receptividade do público para este tipo de arte?
May HD: Até comentei um pouco sobre este cenário na resposta anterior. São duas circunstancias, o fazer e a fruição. Artistas e obras em processo sem muita oportunidade, espaço, apoio e público que alimente uma cena. Contudo, temos que seguir nesta verdade e pensar que nossa produção não é feita exclusivamente para a cidade, mas sim para o mundo, já que estamos conectados a ele fulltime. Seria lindo ver SSA na rota dos grandes eventos da Arte Sonora mas penso que as tradições às vezes nos engolem e assim perdemos o chão, por isso a importancia destas trocas, do transitar por entre, do elevar pontes nem que sejam virtuais. É exatamente o que vem fazendo algumas ações regulares ou calendarizadas como o Festival Internacional CMC, materializações efêmeras do NOISE INVADE.
PA: Seu trabalho com música não se dissocia das artes visuais, como você pensa esse seu processo de criação entre diferentes linguagens artísticas?
May HD: Certamente, até pela minha formação em Artes Visuais. Costumo pensar nesta ‘dobradinha’ (rs) entre linguagens, em especial entre o som e a imagem mas pode ser o movimento, dança, performance…
Tenho pesquisado sobre hibridação, contaminação, arte expandida, tradução intersemiótica mas sempre me deparo com os bons fundamentos da desmaterialização apoiados pela desterritorialização. Assim me sinto completamente liberta para criar. Meu processo tornou-se então a base para as reflexões acerca do mundo ao qual pertenço e (des)acredito. Assim sigo nas investigações do ruído como ponto de partida para pensar o que nos move ou aprisiona seja o resultado final em forma de música, peça escultórica, instalação audiovisual, texto, livro de artista, etc
PA: O que mudou na sua forma de fazer música e explorar o som desde seu trabalho com o tara_code e o luvebox?
May HD: Não mudou, amadureceu. Na real, criou independencia no sentido de uma caminhada mais solitária do ponto de vista da introspecção. Agora consigo me expressar com maior autonomia mesmo quando desenvolvo parcerias, seja em duos, coletivos onde há respeito para dialogar com a obra do outro. Tem sido estes alguns dos meus percursos no ruído.
May HD se apresenta hoje no Teatro Centro da Terra no projeto de residência Re_Verso, proposto pela artista sonora Bella, que convida, além de May, Carol Costa, Nahnati Francischini e Philip Somervell, às 20h — ingresso consciente. Quarta e quinta May se apresenta em duo com Nahnati Francischini (Teratosphonia) nas noites Pântano.