Edson Natale em boa companhia

PoroAberto
3 min readMar 20, 2024

Na última sexta-feira assisti ao show de Edson Natale no teatro do Sesc Pompeia, um show generoso em diversos sentidos. O primeiro, e mais óbvio, claro, é o do partilhar da música. Mas Natale compartilhou sua música cercado de outros muitos músicos talentosos, o que me fez me sentir quase como num encontro, e não distanciada do palco ali na plateia.

A cada um dos músicos que entravam, uma nova relação de beleza e luz se criava. Além de mostrar sua música, Natale também compartilhou conosco uma série de histórias de suas andanças vivendo a música do país, do Oiapoque ao Chuí (como se diz), pelo interior de São Paulo ou pelos bairros da capital. Nessas, apresentou pra gente o som lindo de uma viola feita na cabaça; sua parceria com Maurício Pereira (Não me incommodity); o dia em que Hermeto Pascoal chegou de surpresa para seu aniversário e dali também nasceu uma música; parceria pandêmica com o professor Macalé (Use o frio pra isso)… e segue.

Natale, que é músico, escritor e jornalista, já lançou vários álbuns desde o fim da década de 1980. Mas esse último show deu maior destaque às canções presentes em A egípcia e o mecânico, de 2022, ainda que sem deixar todas as outras música que compõem sua trajetória de lado. Já nas letras (impressas, rs), é organizador, junto com Cris Olivieri, do Guia Brasileiro de Produção Cultural — agora em sua 9ª dição — e do livro Direito, Arte e Liberdade, além de livros infantis. Seu mais recém-lançado é A Música no Brasil que você toca, que reúne uma série de histórias curiosas sobre a história da música brasileira, como o primeiro disco gravado no Amapá e a saga da cantora Maria D’Apparecida.

Mas voltando à apresentação, além dos vários músicos — violino, flauta, percussão e vozes incríveis — outras linguagens artísticas se fizeram presente na construção do show, em diálogo com a música. A poetisa Luz Ribeiro deu voz a seus poemas acompanhada pelo instrumental comandado pelo violão de Natale, mas também, ao final, deu voz a um poema da palestina Muna Almassdar, publicado na antologia Gaza, terra da poesia. Já a artista do corpo Marina Abib deslocou Maurício Badé de trás da percussão para realizarem uma performance. E, por fim, do começo ao fim as projeções de Fernando Velasquez estiveram ali no cenário.

Saí do teatro com um sorriso no rosto, sabe? E ainda mais porque, no final, Natale fez sua manifestação por uma Palestina desocupada e livre — daí a declamação de Luz Ribeiro. Tem me chamado atenção que poucos artistas — ou nenhum — têm feito essa declaração em cima de um palco, os motivos creio que são muitos. Apesar da nossa tragédia cotidiana no Brasil, o governador de São Paulo e sua polícia assassina, o que acontece em Gaza é a maior atrocidade do nosso tempo, cujas imagens são live. E o mundo assistindo… dia após dia.

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